Tropicalização das plataformas de pagamento para concorrer com soluções nacionais

O crescimento conjugado do consumo no varejo e das vendas online no Brasil chamou a atenção de muitas empresas multinacionais que viram no país, a partir de 2010, um mercado já com massa crítica e ainda um grande potencial de progressão, além de um ponto de entrada para a América Latina.

Para as empresas especializadas em pagamento não foi diferente. Houve uma movimentação intensa no setor de pagamentos online nos últimos quatro anos, com a chegada e a consolidação de empresas estrangeiras para competir com as nacionais. Em particular, no setor de gateways de pagamento online.

Este fenômeno pode ter parecido tardio para quem acompanha o desenvolvimento do e-commerce brasileiro desde os anos 2000 e assistiu à vinda antecipada de empresas multinacionais do e-commerce com soluções de e-mail marketing, retargeting ou programas de afiliação.

Para entender esse prazo, é interessante listar as barreiras que plataformas de pagamentos estrangeiras enfrentam para ingressar no mercado nacional.

No Brasil, utiliza-se um meio de pagamento inexistente na Europa ou Estados Unidos: o boleto bancário. Por mais antiquado que pareça no universo on-line, este modelo representa 20% das vendas do e-commerce no Brasil, junto com sua versão mais moderna, a transferência online. A ausência do risco de fraude e o recebimento à vista pelo comerciante são dois diferenciais muito valiosos em termos de rentabilidade que justificam sua participação.

Apesar de existir um padrão da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) para orientar os players deste meio de pagamento, há uma margem de manobra para cada instituição oferecer diferentes atributos aos seus boletos (número de carteira) e seus respectivos layouts. Isso representa um grande desafio para uma plataforma de pagamento conseguir contemplar todas as opções de boleto ofertadas pelos bancos aos seus clientes lojistas.

A quase totalidade dos outros 80% das vendas no Brasil é realizada por cartão de crédito, enquanto o de débito está ainda para decolar.

Tropicalização das plataformas de pagamento para concorrer com soluções nacionaisQuando se fala em venda por cartão de crédito online, tanto para o consumidor quanto para o lojista, logo vem à mente o parcelamento sem juros.

Nenhuma operação e-commerce consegue competir no mercado nacional sem uma oferta ampla de parcelamento sem juros, em 12 ou até mais vezes.

O parcelamento por parte das lojas não existe em outros mercados online maduros no mundo, portanto, as plataformas têm que suportar este meio de pagamento e sua gestão, como, por exemplo, a necessidade de gravar os dados de transação por até 13 meses, uma vez que uma contestação de venda (chargeback) pode ser realizada até o pagamento da última parcela.

A gestão sustentável do parcelamento exige uma solução confiável de conciliação, para que o lojista tenha à sua disposição informações consolidadas de quanto ele vendeu por adquirente, com que taxa de desconto e, consequentemente, quanto ele vai receber de quem e em que data.

Estas informações são vitais para administração de fluxo de caixa, além de auditoria dos custos de comissão e antecipação. Como não existem padrões de extrato de operadores de cartão, muito menos de extrato de bancos, a funcionalidade da conciliação de vendas e bancária se revela muito complexa de desenvolver.

Outro tema intimamente ligado ao pagamento por cartão de crédito pela web (ou pelo televendas) é a fraude.

Diversas pesquisas, como a divulgada pela ClearSale no primeiro trimestre de 2016, mostram que o Brasil apresenta taxas mais elevadas de tentativa de fraude que outros mercados online, como EUA ou Europa. Portanto, para ser completo, um gateway de pagamento deve oferecer recursos de prevenção contra pedidos fraudulentos.

Podemos citar a identificação do país de emissão do cartão e o local do IP de origem da compra como informações complementares a uma análise do conteúdo do pedido, endereço de entrega e consulta de CPF, outra particularidade do mercado Brasileiro.

Poderíamos traçar um paralelo entre as peculiaridades das normas e costumes de pagamento brasileiro e o sistema nacional de tributação. Em proporções menores, os desafios encontrados pelas empresas estrangeiras para ingressar no mercado nacional são comparáveis às dificuldades que empresas globais encaram no setor de plataformas de e-commerce ou ERP no Brasil.

Se, por um lado, as multinacionais devem investir para se adequar às exigências locais, em compensação, elas podem capitalizar sobre sua experiência em meios de pagamento ainda novos no Brasil, como o 3D Secure, plug-in que viabiliza as transações via cartão de débito e de crédito sem risco de chargeback. Este meio de pagamento representa até um terço das transações em países como Inglaterra e França, e deverá ganhar presença no cenário do e-commerce nacional nos próximos anos.

Por Jerome Pays é Diretor de E-Commerce da Lyra Network

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